terça-feira, 28 de agosto de 2007

Corregedor promete rigor

Tiago Barbosa

O Governo do Estado voltou a apostar em um profissional de carreira da Polícia Federal para ficar à frente de um setor estratégico da Secretaria de Defesa Social (SDS). O delegado baiano Raymundo José Araújo Silvany, ex-chefe do Núcleo de Inteligência da Superintendência da PF na Paraíba, assumiu o cargo de corregedor da SDS ontem, em solenidade no auditório do Banco Central, na Rua da Aurora, no Recife. Ele tem 29 anos de experiência na polícia da União e foi indicado pessoalmente pelo secretário de Defesa Social, Romero Meneses, de quem é amigo e ex-companheiro de trabalho na PF. Chegou ao Recife há mais de 15 dias, para conhecer a estrutura do órgão de que se tornou comandante.

Recém-empossado, Raymundo disse que a prioridade da sua atuação será intensificar o controle junto aos inquéritos policiais. Revelou que pretende fazer com que os funcionários da corregedoria façam, por regiões do Estado, o acompanhamento das investigações dentro das próprias delegacias. “Vamos dar preferência às correições, criar estruturas para que a verificação seja feita nos distritos policiais.”, afirmou. Ele mandou um recado aos delegados que descumprem as determinações do Ministério Público: “Temos inquéritos com pedidos do MP não atendidos. Aqueles delegados que não acatam vão ter que se adequar. A correição vai observar isso”.

O corregedor frisou que avalia o quadro de servidores para dar conta da empreitada, mas adiantou que irá solicitar ao secretário Romero Meneses a ampliação de pessoal caso ela seja necessária. “Sei que temos déficit. Hoje são 154 pessoas. Precisamos ver, porém, se há uma má distribuição”, avisou. Ele também adiantou que irá promover capacitações com especialistas para obter sucesso nas fiscalizações. A idéia é incutir no trabalho das Polícias Civil e Militar a filosofia que, segundo ele, predomina na PF: “Na federal, a corregedoria está sempre presente, desde a academia. O policial sabe que a liberdade dele é vigiada”, explicou.

Raymundo também divulgou que almeja tornar mais rigorosa e rápida a punição dos policiais que se desviarem da função e tiverem envolvimento com a criminalidade. E se mostrou disposto a endurecer para dar o exemplo: “Se soubermos de algo, vamos afastar imediatamente. Temos que apurar os fatos em tempo real. Se não mostrarmos na hora certa, o policial vai achar que está impune.”, disse. Ele criticou o acúmulo de pendências na corregedoria, que estaria com mais de quatro mil procedimentos em aberto, e o número de processos de disciplina sobrestados – aguardando um desfecho jurídico para decidir o futuro do policial investigado. São 277, ao todo. “Vou rever o ato de sobrestamento, um por um. Muitos são de crimes graves. Vou dar andamento a eles”, assegurou. Raymundo disse, ainda, que vai criar um núcleo de inteligência na corregedoria.

O secretário Romero Meneses justificou a escolha por um policial fora dos quadros das polícias pernambucanas. “É bom que seja alguém neutro, para se sentir mais à vontade para tomar decisões”, disse. O secretário reiterou que a predominância das atenções será sobre o acompanhamento dos inquéritos e a severidade no trato com o policial que descumprir a função. Ele também demonstrou pressa. “Essa história de esperar trânsito em julgado – conclusão do processo – é para a área criminal. Se demonstrar conduta equivocada, será afastado”, falou. Meneses anunciou, ainda, que colocará mais gente na corregedoria se for necessário e que, até dezembro, a corregedoria funcionará em prédio único. Hoje, atua em dois.

escrita para ser publicada em 28 de agosto

THUNDERCATS: Polícia vai investigar suposto acobertamento

Tiago Barbosa
Mariana Soares


A Corregedoria da Secretaria de Defesa Social vai abrir um processo para investigar a possibilidade de policiais civis - incluindo um delegado - terem agido com o propósito de evitar a prisão de Aloísio Sandro de Lima, conhecido como Sandro Rico, de 28 anos, apontado como um dos líderes do grupo de extermínio que se intitula Thundercats. Detido na última sexta-feira por agentes do Departamento de Homicídio e Proteção a Pessoa (DHPP), ele teria citado o nome de policiais envolvidos com o bando e o valor disponibilizado a eles para continuar foragido.

As declarações foram dadas na sede da Corregedoria, diante de dois promotores e de uma delegada designada pelo novo corregedor, Raymundo José Araújo Silvany, empossado no cargo ontem. Parte do que Sandro Rico contou estaria gravada, garantiu Raymundo, que preferiu manter sob sigilo as identidades dos suspeitos para não atrapalhar o rumo das investigações. O caso será acompanhado de perto por três promotores que já trabalham em parceria com a polícia no levantamento das ações dos Thundercats. A assessoria do Ministério Público informou que o trio não dará declarações à imprensa enquanto durar a apuração.

A defesa de Sandro Rico negou o teor do depoimento. "Isso foi inventado. Não sei de nada disso. Acompanhei todo o relato e sei que isso não aconteceu", refutou o advogado José David Gil Rodrigues Filho. "As acusações feitas contra meu cliente são infundadas, tanto que um dos quatro mandados de prisão preventiva expedidos contra ele foi revogado. Trata-se de um comerciante, um empresário decente", acrescentou José David.

Sandro Rico vinha sendo procurado pela Justiça há mais de cinco meses. Era tido pela polícia como um dos líderes do grupo de extermínio e o homem que disponibilizaria os recursos financeiros para viabilizar as investidas criminosas. Ele foi apresentado à imprensa, ontem, na sede do DHPP, no Espinheiro, em companhia de Everaldo de Souza, chamado de Mago, de 28 anos, também apontado pela polícia como integrante dos Thundercats. Sandro Rico negou qualquer tipo de envolvimento com a quadrilha, mas admitiu ter conhecimento de denúncias dirigidas ao Ministério Público e à Corregedoria sobre a conivência de delegados e policiais com as ações do bando. "Eu não faço parte dos Thundercats. Mas sei que a denúncia é contra um delegado e os policiais civis que trabalham com ele, que libertaram muita gente em troca de dinheiro", declarou.

A Polícia garante que os dois fazem parte da quadrilha especializada em cometer crimes nas mediações do bairro de Jardim São Paulo, no Recife. "O Everaldo estava no rol de pessoas que assassinaram uma mulher, no início deste ano, porque ela teria denunciado o bando à polícia. Sandro é realmente conhecido como o dono do dinheiro que, muitas vezes, era utilizado pelos exterminadores nos ataques", disse o gestor do DHPP, Joel Venâncio. A dupla foi presa, na última sexta-feira, na Estãncia, no Recife, depois de uma denúncia de um informante da polícia. Ambos ocupavam uma Fiorino Branca e levavam uma mulher em trabalho de parto para uma maternidade.

escrita para publicação no dia 28 de agosto

domingo, 26 de agosto de 2007

Polícia prende líder dos Thundercats

Tiago Barbosa

O líder do grupo de extermínio que se auto denomina Thundercats foi preso pela polícia na manhã da última sexta-feira. Aloísio Sandro Batista de Lima, conhecido entre os integrantes do bando como Sandro Rico, de 28 anos, foi detido na Estância, no Recife, por agentes do Departamento de Homicídios e Proteção à Pessoa (DHPP). A informação foi passada pelo comissário do Departamento de Homicídio e Proteção à Pesoa (DHPP), Helivaldo Sodré, e confirmada pelo assessor da Secretaria de Defesa Social (SDS), Joaquim Netto.

A prisão ocorreu depois que os policiais receberam uma denúncia de um informante de que o procurado pela Justiça estaria circulando pelo bairro. Sandro Rico possui, segundo a polícia, três mandados de prisão expedidos contra ele. E é apontado como o responsável pelas operações financeiras que sustentam as ações da quadrilha especializada em crimes fatais nos arredores do bairro de Jardim São Paulo. O cabeça dos Thundercats deverá ser apresentado à imprensa pelo gestor do DHPP, Joel Venâncio, amanhã pela manhã, na sede do órgão, no Espinheiro, no Recife.

Sandro Rico prestou depoimento durante a tarde da sexta-feira. Joaquim Netto disse que ele deu informações sobre pessoas suspeitas de envolvimento com o grupo de extermínio e o modo de agir dos criminosos. A polícia evitou tornar pública a prisão do líder para fazer diligências com base nos dados que ele estava oferecendo. Mas nada foi encontrado até o fechamento desta edição.

As investigações tinham conhecimento de que Sandro circulava em uma Fiorino Branca pelo Recife. "Um informante nos disse que ele estava na Estância. Fomos com quatro homens e o prendemos. Sandro, desarmado, levava uma mulher em trabalho de parto para uma maternidade. Ele estava com um rapaz identificado como Mago, supeito de integrar o grupo", contou Helivaldo Sodré.

sexta-feira, 24 de agosto de 2007

Maria da Penha: Formuladora da lei diz que violência não diminuiu

Tiago Barbosa

A violência praticada contra a mulher, no Brasil, não diminuiu com a implantação da Lei Maria da Penha. A observação pertence a ninguém menos que uma das pessoas responsáveis pela elaboração da legislação que, há pouco mais de um ano, tornou mais graves as penalidades impostas aos homens que agridem as companheiras com quem dividem o lar. Em passagem pelo Recife, ontem, a advogada Leila Linhares Barsted foi categórica ao dizer que o artifício legal estimulou as mulheres a romper os relacionamentos em que os parceiros são agressores.

Mas, por outro lado, a medida insuflou a intransigência de homens que, ao não aceitar o fim da relação determinado pelas ex-parceiras, apelam para o comportamento violento como forma de garantir a convivência do casal. "A gente tem visto que a perda do poder masculino sobre o relacionamento transforma agressores em pessoas ainda mais violentas, a ponto de vê-los chegar ao extremo", frisou ela, na sede da Ordem dos Advogados do Brasil em Pernambuco (OAB-PE), no bairro de Santo Antônio, no Recife.

A preocupação da advogada se expressa em números. Em Pernambuco, por exemplo, a média de mulheres mortas por dia, em 2007, continua praticamente a mesma do ano passado - antes e depois da lei (0,8 contra 0,84). A mortandade é constatada à revelia do aumento nos flagrantes e na quantia de inquéritos remetidos à Justiça. Levantamento da Delegacia da Mulher comparou oito meses seguintes à adoção da lei com o mesmo período de tempo anterior à legislação e verificou que subiu em 3.083% a autuação instantânea dos agressores e em 526% o indiciamento nas investigações policiais.

Vale destacar, porém, que o registro dos homicídios não considera se as mulheres morreram por agressão de ex-companheiros ou por força do envolvimento com o crime. Para a advogada Leila Linhares, no entanto, os altos índices de violência indicam menos uma falha na lei do que o desconhecimento da população a respeito dela. "Nosso propósito é incentivar o debate para que a população conheça a lei", disse ela.

A especialista defende a disseminação da lei como forma de reverter uma cultura que, segundo ela, ainda se apóia bastante na ótica machista. "A sociedade é complacente com esse tipo de violência", pontuou. Diz ela que perduram resistências até mesmo em setores fundamentais para a aplicação da Maria da Penha. "Há locais resistentes à criação dos juizados voltados para o tema, imprescindíveis para validar a lei, penalizar os agressores e proteger as mulheres. Falta qualificação para policiais, promotores, juízes e delegados. As faculdades ainda não tratam da questão do gênero no curso, os universitários desconhecem os tratados nacionais e internacionais sobre a questão", lamenta.

Leila também criticou a concentração do atendimento à mulher nas capitais e a incapacidade de os serviços de plantão policial funcionarem à noite no Interior. Ela enxerga uma razão para tantos entraves. "Falta o entendimento da gravidade da violência doméstica e familiar. Até mesmo entre as mulheres. Se sabemos que há um ladrão nos rondando, tomamos providências. Mas elas parecem não conhecer os recursos de que dispõem quando ameaçadas pelos companheiros violentos", explica. A especialista veio ao Recife para participar de um curso sobre a aplicação da Lei Maria da Penha que tem como público-alvo magistrados, promotores, advogados, delegados, assistentes sociais, psicólogos e estudantes.

OAB vai solicitar que lei seja incluída no Exame

A seccional da Ordem dos Advogados do Brasil em Pernambuco (OAB-PE) vai solicitar ao Conselho Federal da OAB nacional que se torne sistemática a abordagem à Lei Maria da Penha no exame que a entidade realiza anualmente para garimpar os advogados habilitados a exercer a profissão. A idéia do órgão estadual é intensificar o estudo da legislação por parte daqueles que acabaram de deixar a universidade e estão prestes a começar a carreira no Direito.

Vale frisar que o tema já figura nas questões elaboradas para a seleção promovida entre os bacharéis. Mas a OAB-PE quer aumentar a ênfase que vem sendo dada ao assunto e torná-lo pauta recorrente para aprovação dos futuros profissionais. A pretensão da Ordem em Pernambuco foi anunciada, ontem, pelo presidente da instituição, Jaime Asfora, durante reunião com a advogada Leila Linhares Barsted, no bairo de Santo Antônio.

Para Asfora, a inclusão vai ajudar no entendimento da legislação e aguçar a sensibilidade dos bacharéis em relação à violência de gênero, "um problema social grave que acomete o País". "É de caráter emblemático uma vez que a Maria da Penha tem provocado transformações sociais importantes. Queremos que o tema faça parte do conteúdo programático, seja algo específico que conste nos exames. Assim, vamos estimular a sua aplicabilidade", afirmou.

A solicitação será endereçada a Brasília, hoje, via ofício para o presidente da OAB nacional, César Brito. Ele deve designar um relator para apreciar o pedido e votar contra ou a favor do pleito. O parecer será submetido aos 81 conselheiros federais. O exame da OAB é, segundo a assessoria de imprensa do órgão estadual, padronizado em todas as unidades da federação. A prova é elaborada pela Cespe sob diretrizes expressas do Conselho Federal. A exceção fica por conta de sete estados: Minas Gerais, Paraná, Rio Grande do Sul, Rondônia, Roraima, Santa Catarina e São Paulo.

terça-feira, 21 de agosto de 2007

Meio ano depois, fardamento chega a escolas goianenses

Tiago Barbosa

Os alunos da rede pública de Goiana, cidade da Mata Norte do Estado, a 63 quilômetros do Recife, esperaram mais da metade do ano letivo de 2007 para ter a chance de freqüentar as aulas munidos do fardamento escolar. Eles começaram a ganhar, ontem pela manhã, um kit com camisas e shorts, além de mochila e material didático. O conjunto foi distribuído pessoalmente pelo prefeito do município, Henrique Fenelon, e uma comitiva que reuniu de secretários a assessores.

O grupo adentrou cada uma das salas das entidades de ensino municipais para entregar os produtos que deveriam estar de posse dos estudantes há mais de sete meses. O atraso foi justificado pela administração da cidade como conseqüência direta da demora no início das licitações, prejudicadas em função da mudança no comando de Goiana. Fenelon assumiu a prefeitura em meados de 2006, depois que o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) afastou do cargo o então prefeito Roberto Gadelha e o vice Marcílio Rego por abuso de poder econômico.

O atual chefe do Executivo goianense garantiu que, apesar do calendário escolar avançado, o material ainda terá utilidade para os alunos. "Os produtos poderão ser usados até o meio do ano que vem. Embora, em 2008, tenhamos que repetir o processo licitatório para conseguir mais materiais. As sobras deste ano vão ficar com os alunos que se matricularem no próximo semestre", explicou Fenelon. Para o prefeito, os kits escolares são valiosos porque "muitos pais de estudantes não têm condições de bancar as despesas com o fardamento".

Além disso, disse ele, a padronização da roupa "acaba com a diferenciação entre os alunos que podem e os que não podem". Todas as camisas, segundo o prefeito, foram feitas com material de primeira linha. Elas carregam o símbolo e o slogan da prefeitura - "Do jeito do povo" - estampados no tecido. Fenelon calculou que tenha sido gasto quase R$ 1 milhão na aquisição dos kits escolares - entre recursos do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica (Fundeb), do Governo Federal, e dos cofres municipais.

A prefeitura decidiu começar a distribuição do material pelas localidades mais distantes do centro de Goiana. A primeira contemplada foi a Escola João Gonçalves de Azevedo, que fica no distrito de Barra de Catuama, à beira do encontro do Rio Massaranduba com o Oceano, de frente para o Forte do Pontinho, em Itamaracá. A direção da escola montou um café da manhã para a chegada do prefeito e a comitiva dele.

As instituições de Catuama e Ponta de Pedras também foram visitadas pelos membros da prefeitura e ganharam os produtos escolares. O calendário da Secretaria de Educação de Goiana prevê que os kits sejam todos entregues nas 15 comunidades goianenses até a sexta-feira. "Esperamos deixar os alunos preparados para desfilar no 'Fest Banfas', quando antecipamos o nosso 7 de setembro em Goiana", observou a secretária Rose Mary Viégas.

Moradores reclamam ao prefeito

Mães de alunos da Escola Gonçalves de Azevedo e moradores de Barra de Catuama aproveitaram a visita do prefeito Henrique Fenelon para protestar. Reclamaram da quaildade do ensino na instituição e da infra-estrutura das vias da comunidade que, segundo eles, dificultam o acesso até as salas de aula.

A mariesqueira Miriam Barbosa se queixou pelo fato de que a filha dela, com sete anos e na 1á série do ensino fundamental, ainda não consegue ler. Disse ela que grande parte dos estudantes sofrem com o mesmo problema. "Ela não sabe, sequer, escrever o próprio nome", afirmou. Miriam também se mostrou indignada com a merenda que é servida às crianças - segundo ela, a melhor parte dos alimentos fica com professores e diretores - e com a suposta tentativa da direção da escola de não contar às mães sobre a visita do prefeito. "Foi para esconder as críticas", frisou. A cabelereira e artesã Suelen Carvalho se insurgiu quanto à ausência de uma passarela para facilitar o trânsito dos estudantes entre a Rua da Penha e a Rua da Lama. O trecho foi encoberto pelo avanço do mar. "As crianças têm que passar por dentro da casa dos vizinhos", afirmou.

O secretário de Articulação Política e Governo de Goiana, Ilo Jorge, rebateu as reclamações da população. Ele assegurou que, até o dia 15 de setembro, a prefeitura inicia uma obra para permitir a passagem dos alunos na rua atingida pelas águas. "Não adiantava nada construir na época de chuvas. Seria jogar dinheiro no lixo", explicou. Ilo comentou que o problema da educação deve ser observado dentro do quadro que há em Pernambuco. Ele lembrou que o Estado ocupa a rabeira dos rankings de educação em relação ao Brasil. "Mas estamos fazendo progressos com programas como o 'Alfabetização com sucesso' - para corrigir 80% do déficit da rede - e o 'Se Liga'", pontuou.

quinta-feira, 16 de agosto de 2007

Polícia pode demitir PM suspeito de assassinato

Tiago Barbosa

O comandante-geral da Polícia Militar de Pernambuco (PMPE), coronel Iturbson Agostinho, deu início ao processo de licenciamento para demitir sumariamente da corporação o soldado André Luiz Rodrigues de Souza, lotado no destacamento do 2º Batalhão da PM de Tejucupapo, na cidade de Goiana, Litoral Norte do Estado. O militar é suspeito de assassinar com um tiro o estudante Verivaldo Adolfo da Silva Filho, de 16 anos, na noite da última terça-feira, na praia de Pontas de Pedra. O afastamento do efetivo ocorrerá se for provado que ele teve culpa no episódio. A decisão foi tomada antes mesmo de o inquérito instaurado para apurar o caso apontá-lo como responsável proposital pelo disparo da bala que matou o adolescente.

A informação foi divulgada pelo assessor de comunicação da PM, major Martins Júnior. Justifica ele que a medida se fez necessária por causa da conduta do policial, que teria deixado o local em que o garoto foi atingido sem prestar socorro. "Essa não é a atitude de um policial", salienta Martins. O procedimento adotado em desfavor de policiais com menos de dez anos de serviço deve ser concluído em até 30 dias.

O PM André está foragido. Se for encontrado, será preso administrativamente por até 72 horas. As últimas informações levantadas pela polícia, afirma Martins Júnior, dizem que ele compareceu ao destacamento na noite em que o menino faleceu e descarregou a arma que portava durante o trabalho. O processo é de praxe. O policial, continua Martins, tinha ido até o centro da cidade para comprar o jantar quando cruzou o caminho do adolescente Verivaldo.

A partir daí, as suposições contam a história. A morte do garoto está encoberta por duas versões. Uma delas é contada pela família. Deixado na praia por seu padrasto, o forneiro Paulo Sérgio Pereira Brasil, o menino montou numa moto e começou a circular pela praia, apesar de não possuir carteira de habilitação. "Eu fui trabalhar e pedi que ele me aguardasse, pois voltaria logo para jogarmos futebol. Ainda nos falamos por telefone, cerca de vinte minutos antes de eu retornar. Soubemos que ele bateu a moto na do policial antes de ser morto", contou.

Mãe do adolescente, a pensionista Alexandra Rabelo de Souza reproduziu o depoimento de testemunhas e afirmou que o policial teria atirado contra o adolescente depois de desconfiar de sua atitude. "Uma senhora nos disse que meu filho passou duas vezes pela mesma rua. O policial deve ter achado estranho, abordou-o e atirou nele após Verivaldo cair da moto", afirmou ela. Houve quem dissesse, segundo a mãe, que o tiro teria sido acidental. Mas a mulher não acredita. "Como um tiro acidental entra pela clavícula e chega ao coração?", questionou. O PM, prossegue, teria abandonado o seu filho. Alexandra avalia a possibilidade de prestar queixa na Corregedoria de Defesa Social. "Estou com medo de represálias", pontuou.

O major Martins confirmou a abordagem do militar, mas não soube explicar se ele agiu irregularmente. Buscas foram feitas na cidade do PM, em Goiana. Até o fechamento desta edição, o soldado não tinha sido encontrado

Briga de família mata três índios

Tiago Barbosa

Três mortos, dois feridos e uma tribo desfalcada. Foi esse o saldo de um desentendimento entre índios de uma mesma família da etnia Capinaua - que povoa uma reserva em Buíque, no Agreste do Estado, a 285 quilômetros do Recife. A discussão ocorreu na madrugada de ontem, numa aldeia chamada Riachinho, situada a 40 quilômetros do centro do espaço indígena. Os familiares faziam uso de bebidas alcoólicas quando iniciaram o confronto. O agricultor Edílson Antônio da Silva foi morto pelo primo Amerício Gomes da Silva com uma facada no abdômen. A investida ocorreu na presença do irmão do assassino, José Gomes da Silva, e da companheira da vítima, Joseane Bezerra Cavalcanti.

Poucos momentos depois, o irmão de Edílson, Severino Antônio da Silva, e um outro índio, identificado como Paulo Siqueira Bezerra, foram avisados do homicídio. Eles partiram para cima de Amerício e José Gomes, assassinando-os a facadas e tiros de espingarda soca-soca. Perícia feita nos corpos constatou que José Gomes teve quatro ferimentos de faca no tórax, enquanto o irmão Amerício padeceu depois de ser atingido à bala no tórax e braço.

O duelo fez, ainda, mais duas vítimas. A mãe dos irmãos mortos, a presidente da Associação da Aldeia Riachinho, Maria Delmira da Silva, e o irmão dela, José Idalino da Silva, se feriram com os disparos da espingarda. Ambos foram socorridos para a Casa de Saúde de Buíque. Em seguida, transferidos para o Hospital Regional de Arcoverde e, por fim, para o Regional do Agreste. Receberam alta médica no meio da tarde de ontem. Os corpos de José Gomes e Edílson foram liberados pelo Instituto de Medicina Legal (IML) no mesmo dia. O cadáver de Amerício deve sair ainda hoje. O enterro deve ser feito no cemitério do Catimbau, distrito de Buíque.

Depoimento prestado por Joseane diz que Edílson e Amerício tinham uma rixa antiga. Mas, segundo ela, a briga teria sido insuflada pelo consumo excessivo de bebidas alcoólicas. Esse não é o primeiro episódio violento que envolveu os índios da família. O chefe do posto da Fundação Nacional do Índio (Funai) em Buíque, Expedito Marsena Alves, afirma que, há cerca de 15 anos, Serverino teria assassinado o próprio cunhado. Sustenta, ainda, que o rapaz foi condenado pelo crime e cumpriu pena na Penitenciária de Canhotinho, de onde estaria foragido. Depois de cometerem o crime na madrugada de ontem, Severino e Paulo fugiram.

A suspeita de as mortes terem ocorrido em função de um desarranjo familiar colocou a Polícia Civil no caso e, momentaneamente, afastou a Polícia Federal (PF) da dianteira das investigações - embora a PF ofereça apoio nas apurações. O delegado responsável pelo caso é Marivam Bezerra. A reportagem não conseguiu falar com ele. O triplo homicídio foi registrado menos de dez dias depois do índio Capinaua Manoel Pedro Filho, de 21 anos, matar o também índio Gilmar Barbosa de Moura, 31, filho do cacique da tribo. O crime teria sido praticado por desavença familiar.

FUNAI sente dificuldade para fiscalizar consumo de bebida

A venda e o consumo de bebidas alcoólicas são proibidos em áreas de reservas indígenas. Mas, de acordo com a Funai, a legislação nem de longe é seguida à risca no espaço habitado pelos Capinaua, em Buíque. O chefe do posto do órgão de proteção à etnia na cidade, Expedito Marsena Alves, adverte que é excessivo o consumo desse tipo de produto entre os moradores da tribo e alerta que a ingestão do álcool tem ajudado a provocar desentendimentos freqüentes no meio dos índios. "Uma busca feita pela Polícia Federal, hoje (ontem), depois do crime, encontrou mais de vinte garrafas de cachaça vazias em uma das casas. É muita bebida", admira-se.

Os indígenas burlariam o limite legal, diz ele, ao comprar o líquido em feiras dos municípios circunvizinhos e transportá-lo para dentro da tribo em recipientes escondidos. A fiscalização, acrescenta Marsena, é dificultada pela extensão da reserva e a quantidade de índios que nela residem. A Funai informou que são mais de seis mil pessoas alojadas em 23 aldeias. As moradias ocupam um terreno de 16 mil hectares que compreende áreas nos municípios de Tupanatinga, Buíque e Ibimirim. "Além disso, a área é de difícil acesso. Temos problemas em trabalhar. Procuramos fazer reuniões e conscientizá-los sobre os malefícios da bebida. Até religiosos são trazidos para ajudar. Mas uma minoria ignora isso", explicou o chefe do posto.

A estrutura da Funai também não colabora. Apenas seis funcionários estão escalados para atender à demanda de toda a tribo. Chega a faltar combustível para a única viatura de propriedade do órgão. "É impossível fiscalizar. Os índios se sentem à vontade para beber e farrar, seja em aniversários, batizados ou festinhas. Já registramos muitas confusões", lamenta Marsena. Diz ele, ainda, que a presença da Polícia Federal já foi solicitada diversas vezes. "Temos enviado ofícios há quatro anos, mas não conseguimos retorno", afirmou. A assessoria da PF não foi localizada pela Folha.

XUCURU enterrado

O índio da etnia Xucuru José Lindomar Santana da Silva, de 37 anos, foi enterrado, na manhã de ontem, no cemitério de Pesqueira, no Agreste do Estado. Ele foi assassinado na madrugada do último domingo, na PE 219, quando retornava de uma festa em uma moto, na companhia do irmão dele, José Orlando Santana da Silva. Os dois teriam sido emboscados por outra dupla, que os feriu com o disparo de vários tiros. Atingido nas costas, Lindomar morreu na hora. O familiar foi levado para o Hospital Regional do Agreste e, em seguida, transferido para o hospital municipal de Pesqueira.

Segundo o policial federal Válter Assis, as investigações já começaram. "Por enquanto, estamos levantando testemunhas, descobrindo possíveis inimigos. São procedimentos iniciais. Há indícios de que a morte tenha sido fruto da disputa por terra. Não seria a primeira vez naquela localidade", disse ele. A suspeita em torno da possibilidade de um confronto entre os xucurus por conta de terrenos surgiu a partir da constatação de que os dois irmãos atingidos são filhos do ex-chefe da tribo, o cacique da Aldeia Pedra D'Água Francisco de Assis Santana.

Ele foi assassinado em 2001, num episódio relacionado ao registro de terras e indenização de posseiros. A polícia, no entanto, não descarta outras hipóteses, como a de vingança, uma vez que Lindomar foi preso sob a acusação de abusar sexualmente de uma adolescente de 14 anos, no Recife.

terça-feira, 14 de agosto de 2007

Produtor de banda é acusado de planejar homicídio

Tiago Barbosa

A polícia apresentou, ontem pela manhã, na sede do Departamento de Homicídios e Proteção à Pessoa (DHPP), no Espinheiro, no Recife, o produtor musical Nelson Oliveira da Silva, de 52 anos, acusado de planejar o assassinato da ex-mulher, a dona de casa Andréa Patrícia dos Santos, de 33 anos. As investigações mostraram que o crime foi cometido em fevereiro deste ano pelo filho dele, Nelson Oliveira Júnior, em frente aos três filhos da vítima, de oito, dez e 15 anos.

O pai teria ordenado o assassinato depois de discutir com a companheira por conta da venda da casa que pertencia a ela, na rua Aquiles, Ibura, Recife. Ele queria o dinheiro para saldar dívidas, mas ela se recusava a se desfazer do imóvel. Nelson Silva - que agenciava bandas como Só Brega e Chama do Brega - tinha um mandado de prisão expedido em desfavor dele pelo Juizado de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher.

O DHPP conseguiu a quebra do sigilo telefônico do produtor e passou a monitorar seus passos. O advogado dele, contudo, teria descoberto e orientado o cliente a se livrar dos chips. A partir disso, a polícia adotou outra tática: forjar o interesse pela compra da propriedade em que Nelson mantinha uma relação extra-conjugal com Andréa. Casado com outra mulher, ele havia colocado uma placa na propriedade para vendê-la. A prisão foi feita na última sexta-feira, quando um agente do DHPP se passou por um comprador.

O delegado Gilmar Rodrigues disse que Nelson decidiu encomendar a morte da mulher depois de uma discussão travada entre os dois por causa do imóvel. "Ele a jurou de mortena briga. Quando encontrou o filho, contou o que havia ocorrido. Nelson Jr. foi à casa dela e a chamou para o lado de fora. Ela apareceu e ele disparou uma vez. Assim que a mulher caiu, mais cinco tiros foram efetuados. Os filhos de Andréa, que assistiam à cena, imploraram, mas ele não cedeu", afirmou. Nelson Jr. está foragido. O pai foi enquadrado no artigo 29 do Código Penal Brasileiro, por participar do crime.

O inquérito também revelou que Nelson Silva cometeu crime contra a administração federal. Ele teria usado o cartão do bolsa-família de Andréa nos dois meses seguintes à morte dela. O banco descobriu a fraude e comunicou ao DHPP. As informações serão repassadas à Polícia Federal (PF), que vai investigá-las. O cartão foi encontrado na carteira de Nelson, junto com identidade de Andréa e uma foto dela nua. As ligações intermediadas pela polícia mostraram, ainda, que Nelson dava "calote" nas bandas e empresários com quem trabalhava.

Nelson Silva negou as acusações policiais. "Eu nunca faria mal a uma pessoa que amo. A gente discutia, mas não sei quem a matou. Meu filho disse que não foi ele", assegurou. A tia que criou Andréa, Neide Maria Barros Santos, de 50 anos, disse que se sentia parcialmente aliviada. "O outro criminoso ainda está solto", alertou.

segunda-feira, 13 de agosto de 2007

Trecho de Mata Atlântica é suprimido

Obra de duplicação da BR 101 Norte arranca parte da vegetação em Goiana

Tiago Barbosa

A Mata Atlântica já foi a porta de entrada do litoral brasileiro. Quando os europeus aportaram no continente americano, por volta de 1500, a vegetação cobria uma área que se arrastava de onde hoje fica o Rio Grande do Norte até o atual estado do Rio Grande do Sul. Eram cerca de 1,3 milhões de quilômetros quadrados daquela que foi considerada a segunda maior floresta tropical úmida do País, em detrimento, somente, da Amazônica. Anos de ocupação e desenvolvimento das cidades praticamente legaram a formação vegetal ao limbo. Estima-se que existam, hoje, apenas 52 mil quilômetros quadrados, algo em torno de 4% da cobertura inicial.

A devastação fez com que as áreas de Mata Atlântica se tornassem espaços especialmente preservados. E protegidos. Mas nem sempre o progresso consegue respeitar essa limitação. Há casos que insistem em colocar a necessidade do desenvolvimento em rota de colisão com a existência da vegetação. É o que se observa em dois trechos que limitam a cidade de Goiana, no Litoral Norte do Estado, a 63 quilômetros da Capital.

O plano de duplicação da BR 101 esbarrou, por duas vezes, em áreas de Mata Atlântica que ladeiam a pista. A construção de uma via paralela exigia a derrubada de parte da cobertura vegetal. O Governo Federal solicitou, e o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Renováveis (Ibama) consentiu a retirada parcial.

O planejamento das obras estabeleceu que é necessário derrubar 39% da mata. Isso equivale a 0,1 quilômetros quadrados de 0,25 que existem rodeados de cana-de-açúcar nas terras das usinas Maravilha e Santa Tereza. Os números podem parecer baixos. Mas ganham força diante de avaliações feitas pelos órgãos de defesa ambiental. Calcula-se que, da formação inicial da Mata Atlântica em Pernambuco, sobrevivam apenas 3%, índice menor do que o verificado nacionalmente.

O Departamento Nacional de Infra-Estrutura e Transporte (Dnit), que coordena a duplicação, garante que o prejuízo será minimizado pela contrapartida exigida pelo Ibama para permitir o corte na floresta. Pelo termo de Autorização de Supressão de Vegetação n° 155, o Dnit ficou obrigado a elaborar um plano de replantio das espécies mais relevantes.

Nota enviada pelo supervisor de Estradas, Projetos e Meio Ambiente do Dnit, Aston dos Santos, garante que o estudo já foi feito e que as mudas de epífitas, bromélias, propágulos – tipos mais significativos - estão em posse do Instituto de Pesquisas Agropecuárias de Goiana. A área para fazer o replantio, no entanto, ainda está sendo definida em parceria com o Exército, que executa as obras.

O departamento também se comprometeu a doar a madeira colhida para o Instituto Materno Infantil Professor Fernando Figueira (Imip), no Recife, e a Prefeitura de Goiana. O corte começou em maio e deve terminar em agosto. Até lá, uma faixa de até 35 metros à direita da via original deve ser retirada. Técnicos ouvidos pela reportagem da Folha no local, no entanto, disseram que esse campo pode se estender. Em áreas mais elevadas, a intervenção pode chegar a 80 metros . A previsão é de que duplicação em Pernambuco alcance 125 quilômetros .

Entidades lamentam a supressão

Depois do primeiro corte, nada adianta mais. A não ser, acompanhar e fiscalizar. É com esse grau de conformismo que duas entidades que atuam na defesa do meio ambiente - em especial a Mata Atlântica - assistem à derrubada de trechos da vegetação nativa em Goiana. “Após tirar a primeira parte, fica difícil reclamar”, observa o coordenador da Associação Pernambucana de Defesa da Natureza (Aspan), Alexandre Araújo.

Para ele, o trecho da mata que ladeia a BR 101 Norte embora não fosse muito “exuberante”, conserva uma importância para a manutenção da qualidade do ar. “É uma vegetação danificada pela poluição. Mas ajuda a filtrar os poluentes do escape, como o enxofre”, diz. Ele frisa que o replantio – mesmo que seja garantido pelo órgão – tem se traduzido em compensação financeira em outras intervenções.

A crítica, no entanto, não arrefece. O engenheiro agrônomo da Associação para Proteção da mata Atlântica do Nordeste (Amane), Raul Soares, pondera que não seria necessário derrubar a mata. “Desvios poderiam ser feitos. É um desafio para a parte da engenharia”, diz ele. E ironiza: “Dificilmente alguém vê um avanço ser feito nas áreas de canaviais”. Apesar da colocação, o ambientalista faz questão de deixar claro que “não se trata de ser contra ou a favor do corte da mata” e explica: “É uma questão de saber como a gente quer o nosso desenvolvimento. Por cima da vegetação? Isso é progresso? Vale pontuar que compensar nem sempre é algo satisfatório. Às vezes, é mais educativo evitar cortar do que fazê-lo e, depois, plantar mil vezes a mais”.

Alguns estudiosos atribuem à derrubada da Mata Atlântica uma das causas da seca no Nordeste. Isso porque a ausência da floresta impediria a formação das chuvas, e os ventos que sopram do litoral transportariam o sal para a vegetação, sem barreiras naturais. Acredita-se, também, que a devastação prejudique o sistema de reciclagem dos nutrientes do solo. A superfície fica, ainda, desprotegida contra o efeito das precipitações.

Faculdade cria sistema para facilitar transferência

Tiago Barbosa

Transferências de cursos entre instituições de ensino superior costumam causar dores de cabeça. Nem sempre as cadeiras freqüentadas em uma faculdade se encaixam com perfeição na grade curricular da outra entidade. A rejeição das disciplinas provoca, de imediato, dois desgastes para o aluno: a repetição de aulas assistidas e o adiamento da formação acadêmica. Isso quando não exige, ainda, o pagamento pelas mensalidades das atividades que o estudante é obrigado a participar se mudar para uma universidade privada.

A dificuldade já se tornou uma preocupação para o Governo Federal e o Ministério da Educação (Mec). Um decreto presidencial publicado em abril deste ano deu vazão a um projeto da União que pretende, em meio a outros pontos, ampliar e facilitar a mobilidade entre os universitários das redes federais. O Programa de Apoio a Planos de Reestruturação e Expansão das Universidades Federais (Reuni) se propõe a instituir diretrizes que permitam o aproveitamento dos créditos concluídos.

O dispositivo se aplica somente às entidades públicas do Governo Federal. Mas uma iniciativa de uma instituição particular de Pernambuco mostra que é possível estender um modelo que tem a essência semelhante às universidades pagas. A Faculdade de Ciências Humanas Esuda vem colocando em prática, desde 2005, um sistema que considera, ao máximo, as disciplinas cursadas nas universidades anteriormente freqüentadas pelos novos alunos.

O programa foi criado pelo professor Wilson Barreto e é chamado de Currículo Inteligente. Ele explica que o propósito da inovação é elencar diretrizes básicas pelas quais se decide se o recém-matriculado pode ou não aproveitar, na nova escola, o que aprendeu nos locais por onde passou. Em geral, diz ele, a tendência é pelo proveito das disciplinas que o estudante traz na bagagem intelectual.

A Faculdade defende que o Currículo Inteligente (CI) é pioneiro no País. De acordo com o seu inventor, o CI parte do pressuposto de que o mais importante é a noção que o aluno desenvolve a partir do assunto. Isso eliminaria, segundo Wilson Barreto, a necessidade de ele assistir a conteúdos que, sozinho, poderia aprender. Um exemplo ilustra melhor a teoria: “Se na faculdade que ele estudava, freqüentou aulas de História do Brasil, não há porque ser obrigado comparecer às salas para estudar História Geral. Quem faz a primeira cadeira é plenamente capaz de entender a segunda. O que interessa é que o estudante tenha a base do que significa estudar história”, explica. Ele diz que a postura do Esuda é adequar o que o aluno fez à grade curricular dos cursos que a universidade oferece. “O interessante é preservar o que ele tem”.

Beneficiada pelo novo método, a estudante de Arquitetura Renata Caribe finalmente enxerga no horizonte a chance de se formar. Desde 1999, ela vai às aulas. Mas o período letivo precisou ser interrompido por várias vezes: mudança com a família para a Bahia, nascimento de dois filhos e o retorno ao Recife. A cada matrícula, o embate se repetia.

E a conclusão se adiava. “Em Salvador, mesmo faltando poucos créditos, eu teria que passar mais de dois anos na faculdade. Ainda tive que fazer uma prova para validar as disciplinas. Perdi muitas cadeiras. Quando regressei ao Recife, só não tive dificuldade porque precisei conversar com a diretora. Até que desfrutei do sistema do Esuda. Foi ótimo”, contou. Renata se forma no final deste ano.


Método evita pagar por cadeiras

O novo método de enquadrar o aluno transferido, aposta o professor Wilson, ajuda a eliminar a prática adotada por várias universidades de atrasar a formação do curso por conta de uma recusa em aceitar currículos que elas não elaboraram. “E também deixam de faturar o que cobrariam a mais ao impor as cadeiras da grade”, acrescenta ele. O inventor do sistema, no entanto, diz que não é fácil estendê-lo a todos os cursos porque ainda há resistência entre coordenadores.

Para o professor, ainda há uma outra vantagem na adoção do Currículo Inteligente. “Quando o estudante deixa as aulas, ele leva no currículo não somente os créditos equivalente às cadeiras que cursou na faculdade pela qual se formou. Carrega, ainda, o conhecimento obtido em outras instituições. Exemplo: se ele fez engenharia em uma universidade, mas opta por transferir para direito, depois de chegar ao bacharelado terá registrado no currículo o que aprendeu sobre as disciplinas da primeira faculdade”, observou.

Violência afasta turistas de PE?

Tiago Barbosa

A violência é uma praga que apodrece o que toca. Desestrutura famílias, destrói vidas, amputa sonhos e corrói as relações humanas. Aguçado pela criminalidade, o desarranjo debilita o convívio social e instala a permanente sensação de insegurança em quem tem o dissabor de prová-lo. Os pernambucanos sofrem na pele os altos índices de crimes que colocam a unidade da federação como a mais violenta do País. Pesquisa obtida com exclusividade pela Folha, no entanto, sugere que o receio vai além, se alastra no rastro da informação e é capaz, até, de frear o ímpeto dos que sonham em conhecer o Estado. O estudo diz que turistas estrangeiros e nacionais chegam e deixam Pernambuco com uma impressão negativa sobre a violência local, o que traria prejuízos ao comércio e travaria uma demanda turística ainda maior.


O levantamento foi feito pela agência de publicidade BM4Comunicação a partir de dificuldades que clientes que atuam no setor turístico vinham enfrentando. Eles supunham que o fluxo de pessoas ao Estado estava em decadência, e, por isso, os empreendimentos que administram amargavam prejuízos financeiros com a baixa procura. Pesquisadores contratados pela instituição aplicaram questionários em 200 turistas (70% nacionais e 30% estrangeiros) no Aeroporto Gilberto Freyre – Jaboatão dos Guararapes e em pontos turísticos distintos do Estado. O resultado foi surpreendente, diz o coordenador do estudo, o sociólogo e publicitário Osvaldo Matos de Melo Junior: “Foi além do esperado. Há uma sensação de insegurança muito forte”.

A pesquisa mostra que 80% dos entrevistados se informaram antes de visitar Pernambuco. Desses, 81% teriam obtido dados negativos sobre a violência no Estado. Mais de 30% saberiam dos assassinatos, 20% conheceriam a realidade de assaltos e furtos e 8% descobriram informações sobre seqüestros. O conhecimento prévio não foi suficiente para redimi-los da vontade de fazer a viagem. Mas, segundo Osvaldo Matos, é possível que muitos outros tenham desistido ao se deparar com notícias desfavoráveis sobre a criminalidade pernambucana. “Temos um estado tão lindo, tão maravilhoso em suas belezas, ecossistemas e variedades de turismo, que eles vêm, por mais que tenham consciência da gravidade. Imagine se não tivessem essas informações?”, questiona.

Nenhum dos entrevistados disse ter sofrido violência enquanto esteve em Pernambuco e mais de dois terços indicariam o local para conhecidos. Mas, quando perguntados sobre que fatores os levariam a não recomendar o Estado, a maioria das respostas convergiu para a questão da segurança pública: 67% afirmaram que a proteção faz falta – dificuldade que supera o tão propalado medo de ataques de tubarão (com 1%). O problema da insegurança foi o mesmo diante da indagação a respeito do que eles menos gostaram, da recordação mais triste que vão levar na bagagem de volta e do pior serviço oferecido. Pouco mais da metade não se sente segura no Estado, assegura a pesquisa.

“Muitos vêm com uma noção negativa e a confirmam aqui. Lêem nos jornais, escutam nas ruas, testemunham. Se não se sentem seguros, não saem, não usufruem dos serviços, não gastam. Assim sendo, não movimentam a economia, geram desemprego”, avalia Osvaldo. Vale frisar, contudo, que a pesquisa fez tanto perguntas abertas quanto indutivas – em que a resposta é delimitada pelo entrevistador. O grau de confiança foi definido em 95%.

Visitante costumeiro do Recife, o paulista e engenheiro-consultor Cláudio Mendes discorda das conclusões da pesquisa. Diz que, de fato, Pernambuco carrega a imagem de estado mais violento do País, mas alega que isso não é suficiente para inibir o turista. “Não acredito que alguém deixe isso influir na decisão de visitar o Estado. É preciso saber filtrar as informações e conhecer in loco a realidade. Violência, afinal, tem em todo o Brasil”, afirma ele. O representante comercial piauiense Marcos Sá acrescenta que, diante das notícias sobre violência, o “turista pode até ficar mais precavido, mas nunca deixar de vir”. “Pretendo voltar e vou recomendar Pernambuco”, garante.


Números contestam pesquisa

Não são apenas algumas opiniões de turistas que confrontam as indicações da pesquisa feita pela BM4Comunicação. Dados do Ministério do Turismo e da Empresa Pernambucana de Turismo(Empetur) refutam a tese de que os elevados índices de violência possam frear a procura pelo Estado. Para o presidente da Empetur, Allan Aguiar, “o fato de comentar a segurança pública não significa dizer que os turistas vão evitar repetir a viagem ou fazer o marketing boca a boca nos locais de onde vieram”. Aguiar diz que o quesito proteção é citado em qualquer levantamento e que, segundo um estudo reproduzido em uma revista de circulação nacional, “Pernambuco é menor em ocorrências com turistas do que estados menos violentos nas estatísticas e que lideram a demanda turística no Nordeste – Bahia e Ceará”.

A sondagem feita pela Empetur entre janeiro e maio deste ano aplicou 1,8 mil questionários no Aeroporto, Terminal Integrado de Passageiros, nas BRs 101 Sul, 101 Norte e 232 em turistas brasileiros e estrangeiros para verificar, em meio a outros pontos, a relação entre violência e turismo. O levantamento apontou que, em Pernambuco, houve menos assaltos a visitantes, quantidade inferior de estupros, número menor de ocorrências em geral na comparação com Bahia e Ceará. Nenhuma morte de turista foi registrada no Estado no período observado (confira quadro). O estudo se baseou em dados fornecidos pela Secretaria Necional de Segurança Pública, Secretarias Estaduais, Polícias Civil e Militar.

Os números insuflam o argumento da Empetur. “É bom frisar que 97% dos nossos turistas têm a intenção de voltar. Segurança pública é um dos serviços públicos avaliados pelos turistas, assim como sinalização e limpeza. O Rio de Janeiro aparece direto com episódios de violência e é o mais visitado”, pondera Allan Aguiar. Outro dado é utilizado pela Empetur para afastar a idéia apresentada pela pesquisa da BM4Comunicação. Dados da CVC, uma das maiores operadoras de turismo do País, revelam que a queda na venda de pacotes, entre 2006 e 2007, foi menor em Pernambuco do que nos vizinhos Bahia, Ceará e Rio Grande do Norte – líderes na visitação turística no Nordeste.

Pesquisadora sugere cautela na avaliação dos dados

Coordenadora da Oficina de Segurança, Justiça e Cidadania da Fundação Joaquim Nabuco, a pesquisadora Ronidalva Melo sugere cautela no momento de avaliar os dados da pesquisa que tenta relacionar violência e procura pelos destinos turísticos. Frisa que o resultado do levantamento pode ser influenciado pelo instante em que foi realizado e pelo objetivo da viagem feita até Pernambuco. “Uma sondagem feita durante o flagrante de violência durante o desfile do bloco Balança Rolha (em que brigas foram filmadas pelas emissoras de televisão) este ano poderia mostrar que há uma sensação de insegurança. No entanto, observamos que, dias depois, o carnaval transcorreu com muitos turistas. É preciso ponderar, também, que muitos vêm ao Estado para conhecer a realidade dos menos favorecidos”, explica.

Ronidalva pondera, no entanto, que o impacto das informações negativas sobre violência pode ser suficiente para interferir na escolha do turista. Embora, diga ela, que não se trata de uma “epidemia que restrinja absurdamente o fluxo turístico”. “O turista pode buscar contra-informação, ou seja, dados que confrontem com a realidade que ele está se colocando a par. O boca a boca também conta. Uma coisa é se informar. Outra é vir e viver na prática”, avalia.

Embate na educação pode parar na OIT

Tiago Barbosa

O embate entre educadores e o governo de Pernambuco tem tudo para ganhar dimensão internacional. A Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação (CNTE) se mobilizou para solicitar à Organização Internacional do Trabalho (OIT) que interceda junto à administração do Estado e evite a punição dos servidores que se recusarem a voltar ao batente.

Medidas anunciadas na última quarta-feira pelo secretário de Educação, Danilo Cabral, determinaram a reapresentação dos professores no máximo até o próximo dia 7, sob pena de afastá-los do cargo e contratar substitutos. O ponto dos faltosos já havia sido cortado. A secretaria considerou a rejeição da proposta governamental pelos educadores - em assembléia no dia 31 de julho - como o sinal de que as negociações deveriam ser encerradas. A paralisação nas escolas públicas chega, hoje, a 54 dias. Estima-se que 300 mil alunos estejam sem aulas. A taxa média de adesão à greve está em 45%.

A presidente da CNTE, Juçara Dutra Vieira, justificou o apelo a um órgão internacional como uma tentativa de reabrir a negociação. Para ela, a atitude da administração do Estado foi unilateral quando decidiu pôr fim ao diálogo e impor punições aos professores que insistirem na interrupção das atividades. "Não pode ser assim. Numa negociação, as duas partes têm que ceder. Mas os governos se valem da máxima de que não há direito à greve. Isso está errado", observou ela, em entrevista à Folha, por telefone. Juçara revelou ter levado a situação vivenciada pelo ensino público em Pernambuco ao conhecimento da Organização Internacional da Educação (OIE), que representa cerca de 30 milhões de trabalhadores em todo o mundo. É através dessa entidade que ela quer fazer o problema aportar na OIT. "Vamos solicitar que seja garantido nosso direito sindical sem punição", adiantou.

A coordenadora contou que a mediação estrangeira foi requisitada no transcorrer da paralisação dos professores na Bahia. "Na mesma semana, o governo baiano recebeu uma notificação da OIT pedindo que fossem revogadas as penalidades aos docentes. O órgão não tem o poder normativo, mas a intervenção contribuiu para as negociações, que fizeram a greve acabar há cerca de 15 dias", destacou. A presidente ressalvou, no entanto, que providencia a comprovação das punições impostas aos docentes pernambucanos para formalizar o pedido à OIT.

O Sindicato dos Trabalhadores em Educação de Pernambuco (Sintepe) faz uma assembléia com os professores hoje, às 9h, na quadra do complexo IEP, no Treze de Maio, no Recife, pra decidir quais os próximos rumos do movimento grevista. "Os encaminhamentos são tomados de forma coletiva. Não aceitamos de maneira individualizada, para beneficiar os que retornarem, como propôs o governo", pontuou o presidente do Sintepe, Heleno Araújo.

Vinculada: Cedes a favor do governo

O tema educação figurou como um dos principais na reunião extraordinária do Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social (Cedes) no Palácio do Campo das Princesas, Santo Antônio, Recife, na manhã de ontem. A apresentação do Plano Plurianual (2008/2011) foi colocada de lado para que o secretário Danilo Cabral expusesse a 41 conselheiros os detalhes da negociação entre governo e professores. Disse ele que houve apoio à maneira como o Estado conduziu o diálogo com os docentes e às medidas para o retorno das aulas anunciadas na quarta-feira.

"Houve compreensão por parte dos conselheiros de que o Estado fez o que pôde para negociar. Infelizmente, o calendário de reposição das aulas já vai invadir o ano de 2008", afirmou Danilo.
A coordenadora da câmara temática que trata da educação no Cedes, professora Silke Weber, não quis comentar o confronto entre professores e governo. Disse que seus integrantes expressaram posicionamento em ata de reunião no dia 17 de julho. Mas o documento no site do Conselho não faz menção específica à atual crise no ensino público estadual. A câmara volta a se reunir na segunda-feira. O governo estipulou um prazo de 40 dias para que o Cedes avalie os sistemas de gestão no ensino público e na saúde.

Presidente do grupo EQM e conselheiro do Cedes, Eduardo Queiroz de Monteiro avaliou o encontro como positivo. "O governo mostrou que está mobilizado. Os números foram tratados com transparência e equilíbrio. Um diagnóstico preciso sobre a situação foi passado para os conselheiros", observou. O Cedes foi criado, no final de maio, com a função de debater as políticas públicas e os entraves ao desenvolvimento do Estado. Hoje, conta com 51 conselheiros. Mas, quando completo, terá 65.

escrita em 2 de agosto

Informática favorece dados no HR

Tiago Barbosa

A Secretaria de Defesa Social (SDS) de Pernambuco lançou mão de uma estratégia para melhorar a captação e processamento de dados nas ocorrências relacionadas às vítimas da violência que derem entrada no Hospital da Restauração (HR), no Derby, no Recife. O órgão dotou o posto policial que fica na unidade de saúde de um sistema informatizado capaz de alimentar e disponibilizar em tempo real para investigações as informações sobre os casos que aportarem no hospital.

A SDS quer que o Boletim de Ocorrência Eletrônico, que está em funcionamento há mais de vinte dias no HR, seja levado para as principais emergências do Estado. O próximo centro a receber a ferramenta será o Hospital Getúlio Vargas, no Cordeiro.

A escolha pelo HR, segundo a SDS, se se justificou por conta da alta demanda mensal recebida pela unidade. Dos cerca de 18 mil atendimentos registrados no local, 15% fazem referência a uma situação que pode gerar uma ocorrência policial. Para a chefe da Unidade de Tecnologia da Informação da Polícia Civil, Mary Anne Belfort, o serviço vai agilizar o repasse dos dados para que sejam iniciadas as investigações e aumentar a eficácia na apreensão de criminosos.

A diminuição do tempo para que as informações se tornem acessíveis às delegacias é, segundo a delegada, fator determinante para que isso ocorra. Explica ela: "Antes, registrávamos de quatro a seis dias para fazer o material chegar até a DP e instalar um inquérito. O boletim saía do HR, seguia para a Delegacia do Espinheiro (encarregada de fazer a triagem), passava pela Diretoria de Polícia e, finalmente, era encaminhado para a delegacia em cuja circunscrição o crime ocorreu. Agora, ele vai estar no sistema pouco tempo depois de ser preenchido pelos agentes do posto policial". Mary Anne garante que um relato feito no domingo à noite estará disponível já na segunda pela manhã.

A eficácia do trabalho policial seria favorecida não somente pela agilidade do registro dos dados, mas pela exploração do momento em que eles são colhidos. "Na emergência, as pessoas contam as vesões inteiras. Há casos em que elas se furtam a dizer o que sabem depois que as investigações são tocadas. Aquele é o melhor instante para apurar", observa. A idéia da SDS também é utilizar as informações apanhadas para formar um rico banco de dados que possibilite elaborar ações policiais ou aproximar a atuação em conjunto entre as delegacias.

"Se uma pessoa cometeu estupro em dois locais diferentes, pelas características do estuprador poderemos saber se o crime praticado tanto no Cordeiro quanto em Pau Amarelo, por exemplo", diz. A delegada afirmou que os agentes passaram por um treinamento para operar o novo sistema.

PREVISÍVEL: Idosa é mora pelo ex-companheiro

Tiago Barbosa

Era quase certo que uma tragédia rondava a casa de muro verde da rua Jacira, na comunidade de Sapucaia de Dentro, em Olinda. O comportamento do mecânico Lusivaldo Mendes, de 51 anos, em relação à sua ex-companheira, a autônoma Isabel Alves de Santana, de 60 anos, mostrava que ele não estava disposto a aceitar a separação. Mesmo depois de ter sido colocado para fora da residência, há 15 dias, o homem insistia em procurá-la. Queria retornar para o lar.

Diante das recusas, as ameaças eram constante. A polícia interveio por vezes. Mas nada adiantou. Na madrugada do domingo, a história saiu do campo verbal para o físico. O mecânico invadiu a propriedade onde a autônoma estava e a assassinou com golpes de faca. Em seguida, tentou se matar, mas foi socorrido e, até o fechamento desta edição, estava internado no setor de trauma do Hospital da Restauração, no Derby, no Recife. O estado de saúde dele é grave.

Os indícios sugerem que o crime poderia ter sido evitado. Familiares e amigos do casal contaram que Lusivaldo costumava arrumar encrenca quando bebia. "Ele a esculhambava, brigavam muito", disse a vizinha Gersina Nunes. Os dois estavam juntos há 12 anos. Conheceram-se em uma festa. Desde então, dividam a mesma casa com a mãe de Isabel, uma senhora de 91 anos. O vício pela bebida, disseram conhecidos dela, chegou a um nível insuportável. A situação complicou de vez há duas semanas.

O mecânico travou uma discussão com a filha da idosa, Celma, e a teria agredido com uma faca. "Ele pegou uma faca e ela se esquivou. Mas ainda conseguiu cortar a barriga dela. Celma prestou queixa na Delegacia de Peixinhos", falou a estudante Catarina Daiane, vizinha de Lusivaldo e Isabel. Ela acrescenta que policiais chegaram a comparecer à casa na rua Jacira, mas não tiveram sucesso em encontrá-lo. Não foi a primeira vez que um problema da família envolveu a polícia. "Ela já tinha prestado queixa contra ele outras vezes", disse a estudante. Hoje, Lusivaldo iria à Delegacia da Mulher prestar depoimento. Mas, segundo os moradores de Sapucaia, ele estava disposto a evitar o comparecimento à DP. A todo custo.

"Antes de ir para a delegacia, eu faço qualquer coisa. Se eu não matá-la, toco fogo na casa. Ela tem que ser minha", disse a vizinha Catarina. Na noite do crime, ele foi até a casa de Isabel. Com medo, ela vivia trancada. Mas não deixava de se preocupar com o ex-companheiro. Ela costumava lavar suas roupas e chegou a alugar um quartinho para ele morar.

No sábado, a idosa solicitou que o mecânico comprasse pão. Ao retornar, deu-lhe café. Pediu que fosse embora. Chovia muito, e Lusivaldo, aparentemente, resolveu aceitar a sugestão. No início da madrugada, no entanto, ele retornou, segundo os vizinhos. Cortou o fio do telefone. Destelhou o teto sobre a cozinha. Foi até o quarto. Usou duas facas para matar a mulher, que teve ferimentos na mão, pescoço e cabeça, segundo a perita do Instituto de Criminalística (IC), Verônica Melo. Depois, utilizou uma das facas para cortar o próprio pescoço. Acredita-se que ele tenha tentado fugir - pois existem marcas de sangue no balcão da cozinha. Sem forças, contudo, caiu e foi salvo pela ambulância do Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (Samu), chamada por moradores.

"Eu dizia para ela ter cuidado"

Inconsolável, a irmã de Isabel, Severina dos Ramos, de 72 anos, parecia saber que o crime era questão de tempo. "Eu dizia para ela ter cuidado, não confiar nele. A gente se comunicava muito e ela demonstrava medo. Ele costumava brigar com os três filhos dela. Mas Isabel fazia questão de não envolvê-los", recordou. Na última vez em que as duas se viram, na noite do sábado, Isabel conversava com Lusivaldo ao portão. Ele estava do lado de fora. Ela, trancada em casa. Quando ele foi embora, Severina sentiu-se aliviada para dormir. Pela manhã, como de costume, chamou a irmã para irem até igreja. "Mas ela não respondeu. Vi, pelo vasculhante, que faltavam telhas na casa dela. Quando estava no templo, fui avisada do crime", contou. "E, agora, o que é que eu faço? Tudo nós fazíamos juntas", lamentou.

A mãe de Isabel, que, segundoa a família, sofre de problemas mentais, teria escutado o momento em que Lusivaldo abordou a filha. "Ela nos disse que Isabel chorou muito durante a noite e, em seguida, silenciou", falou Severina. O sobrinho de Isabel, Luciano Santana, de 37 anos, disse à reportagem que o enterro da idosa está marcado para as 11h de hoje, no cemitério de Santo Amaro. Segundo a Polícia Militar, as circunstâncias da morte serão apuradas pela Delegacia de Peixinhos.

A Folha entrou em contato com a delegada do Departamento de Polícia da Mulher, Verônica Azevedo, para saber se houve negligência policial no atendimento e proteção à autônoma, uma vez que a idosa era ameaçada constantemente pelo ex-companheiro. Ela disse que vai se inteirar do caso hoje, com a Delegacia da Mulher, em Santo Amaro. "Tenho que puxar os boletins de ocorrência para saber o que houve", adiantou. Em geral, afirmou a delegada, medidas protetivas são adotadas de acordo com a Lei Maria da Penha para garantir a segurança da mulher que é jurada de morte pelo ex-companheiro.