segunda-feira, 13 de agosto de 2007

Violência afasta turistas de PE?

Tiago Barbosa

A violência é uma praga que apodrece o que toca. Desestrutura famílias, destrói vidas, amputa sonhos e corrói as relações humanas. Aguçado pela criminalidade, o desarranjo debilita o convívio social e instala a permanente sensação de insegurança em quem tem o dissabor de prová-lo. Os pernambucanos sofrem na pele os altos índices de crimes que colocam a unidade da federação como a mais violenta do País. Pesquisa obtida com exclusividade pela Folha, no entanto, sugere que o receio vai além, se alastra no rastro da informação e é capaz, até, de frear o ímpeto dos que sonham em conhecer o Estado. O estudo diz que turistas estrangeiros e nacionais chegam e deixam Pernambuco com uma impressão negativa sobre a violência local, o que traria prejuízos ao comércio e travaria uma demanda turística ainda maior.


O levantamento foi feito pela agência de publicidade BM4Comunicação a partir de dificuldades que clientes que atuam no setor turístico vinham enfrentando. Eles supunham que o fluxo de pessoas ao Estado estava em decadência, e, por isso, os empreendimentos que administram amargavam prejuízos financeiros com a baixa procura. Pesquisadores contratados pela instituição aplicaram questionários em 200 turistas (70% nacionais e 30% estrangeiros) no Aeroporto Gilberto Freyre – Jaboatão dos Guararapes e em pontos turísticos distintos do Estado. O resultado foi surpreendente, diz o coordenador do estudo, o sociólogo e publicitário Osvaldo Matos de Melo Junior: “Foi além do esperado. Há uma sensação de insegurança muito forte”.

A pesquisa mostra que 80% dos entrevistados se informaram antes de visitar Pernambuco. Desses, 81% teriam obtido dados negativos sobre a violência no Estado. Mais de 30% saberiam dos assassinatos, 20% conheceriam a realidade de assaltos e furtos e 8% descobriram informações sobre seqüestros. O conhecimento prévio não foi suficiente para redimi-los da vontade de fazer a viagem. Mas, segundo Osvaldo Matos, é possível que muitos outros tenham desistido ao se deparar com notícias desfavoráveis sobre a criminalidade pernambucana. “Temos um estado tão lindo, tão maravilhoso em suas belezas, ecossistemas e variedades de turismo, que eles vêm, por mais que tenham consciência da gravidade. Imagine se não tivessem essas informações?”, questiona.

Nenhum dos entrevistados disse ter sofrido violência enquanto esteve em Pernambuco e mais de dois terços indicariam o local para conhecidos. Mas, quando perguntados sobre que fatores os levariam a não recomendar o Estado, a maioria das respostas convergiu para a questão da segurança pública: 67% afirmaram que a proteção faz falta – dificuldade que supera o tão propalado medo de ataques de tubarão (com 1%). O problema da insegurança foi o mesmo diante da indagação a respeito do que eles menos gostaram, da recordação mais triste que vão levar na bagagem de volta e do pior serviço oferecido. Pouco mais da metade não se sente segura no Estado, assegura a pesquisa.

“Muitos vêm com uma noção negativa e a confirmam aqui. Lêem nos jornais, escutam nas ruas, testemunham. Se não se sentem seguros, não saem, não usufruem dos serviços, não gastam. Assim sendo, não movimentam a economia, geram desemprego”, avalia Osvaldo. Vale frisar, contudo, que a pesquisa fez tanto perguntas abertas quanto indutivas – em que a resposta é delimitada pelo entrevistador. O grau de confiança foi definido em 95%.

Visitante costumeiro do Recife, o paulista e engenheiro-consultor Cláudio Mendes discorda das conclusões da pesquisa. Diz que, de fato, Pernambuco carrega a imagem de estado mais violento do País, mas alega que isso não é suficiente para inibir o turista. “Não acredito que alguém deixe isso influir na decisão de visitar o Estado. É preciso saber filtrar as informações e conhecer in loco a realidade. Violência, afinal, tem em todo o Brasil”, afirma ele. O representante comercial piauiense Marcos Sá acrescenta que, diante das notícias sobre violência, o “turista pode até ficar mais precavido, mas nunca deixar de vir”. “Pretendo voltar e vou recomendar Pernambuco”, garante.


Números contestam pesquisa

Não são apenas algumas opiniões de turistas que confrontam as indicações da pesquisa feita pela BM4Comunicação. Dados do Ministério do Turismo e da Empresa Pernambucana de Turismo(Empetur) refutam a tese de que os elevados índices de violência possam frear a procura pelo Estado. Para o presidente da Empetur, Allan Aguiar, “o fato de comentar a segurança pública não significa dizer que os turistas vão evitar repetir a viagem ou fazer o marketing boca a boca nos locais de onde vieram”. Aguiar diz que o quesito proteção é citado em qualquer levantamento e que, segundo um estudo reproduzido em uma revista de circulação nacional, “Pernambuco é menor em ocorrências com turistas do que estados menos violentos nas estatísticas e que lideram a demanda turística no Nordeste – Bahia e Ceará”.

A sondagem feita pela Empetur entre janeiro e maio deste ano aplicou 1,8 mil questionários no Aeroporto, Terminal Integrado de Passageiros, nas BRs 101 Sul, 101 Norte e 232 em turistas brasileiros e estrangeiros para verificar, em meio a outros pontos, a relação entre violência e turismo. O levantamento apontou que, em Pernambuco, houve menos assaltos a visitantes, quantidade inferior de estupros, número menor de ocorrências em geral na comparação com Bahia e Ceará. Nenhuma morte de turista foi registrada no Estado no período observado (confira quadro). O estudo se baseou em dados fornecidos pela Secretaria Necional de Segurança Pública, Secretarias Estaduais, Polícias Civil e Militar.

Os números insuflam o argumento da Empetur. “É bom frisar que 97% dos nossos turistas têm a intenção de voltar. Segurança pública é um dos serviços públicos avaliados pelos turistas, assim como sinalização e limpeza. O Rio de Janeiro aparece direto com episódios de violência e é o mais visitado”, pondera Allan Aguiar. Outro dado é utilizado pela Empetur para afastar a idéia apresentada pela pesquisa da BM4Comunicação. Dados da CVC, uma das maiores operadoras de turismo do País, revelam que a queda na venda de pacotes, entre 2006 e 2007, foi menor em Pernambuco do que nos vizinhos Bahia, Ceará e Rio Grande do Norte – líderes na visitação turística no Nordeste.

Pesquisadora sugere cautela na avaliação dos dados

Coordenadora da Oficina de Segurança, Justiça e Cidadania da Fundação Joaquim Nabuco, a pesquisadora Ronidalva Melo sugere cautela no momento de avaliar os dados da pesquisa que tenta relacionar violência e procura pelos destinos turísticos. Frisa que o resultado do levantamento pode ser influenciado pelo instante em que foi realizado e pelo objetivo da viagem feita até Pernambuco. “Uma sondagem feita durante o flagrante de violência durante o desfile do bloco Balança Rolha (em que brigas foram filmadas pelas emissoras de televisão) este ano poderia mostrar que há uma sensação de insegurança. No entanto, observamos que, dias depois, o carnaval transcorreu com muitos turistas. É preciso ponderar, também, que muitos vêm ao Estado para conhecer a realidade dos menos favorecidos”, explica.

Ronidalva pondera, no entanto, que o impacto das informações negativas sobre violência pode ser suficiente para interferir na escolha do turista. Embora, diga ela, que não se trata de uma “epidemia que restrinja absurdamente o fluxo turístico”. “O turista pode buscar contra-informação, ou seja, dados que confrontem com a realidade que ele está se colocando a par. O boca a boca também conta. Uma coisa é se informar. Outra é vir e viver na prática”, avalia.

Nenhum comentário: